p/ Paula O céu azul é muito importante na vida dos passarinhos Porque os passarinhos precisam antes de belos ser eternos. Eternos como uma fuga de Bach Manuel de Barros — De Passarinhos |
Quisera me espalhar na natureza, encontrar a beleza azul da imensidão; saber a gramática do chão e dos elementos, a matemática dos ventos e das mãos. Encantaria animais com a poesia que já não cantam mais os poetas hodiernos. Derramar-me-ia terno nos mares, nos ares, nos perfumes e nos lares somente para sorver a eternidade do verso, viver o meu anverso feito canção.
Penso que meus sussurros chegariam aos teus ouvidos, aos teus sentidos, com mais estrondo do que um trovão. Bastaria um ato de vontade para ofertar-lhe a potestade dum ramo de poesias bem olentes, colher flores que estariam bem contentes em comunicar-lhe a complexa criação. Bastaria um pouco de desejo para criar asas, sobrevoar casas, oceanos, o Tejo... e levar um céu azul (ou cinéreo) numa aquarela para com ele descortinar tua janela, levantar o véu de teus olhinhos (tão belos) para te mostrar, ao som de um violoncelo, a poética de um instante-passarinho.
Far-me-iam minhas asas, destarte, uma gaivota; mudaria de meu vôo a rota tendo o céu e o Tejo por estandarte, apenas para mirar tua face e sorver os poemas de teus olhos, brilhantes e plenos de mar (de rosas, e também de abrolhos). Far-me-iam meus lábios, destarte, brisa — o vento que se suaviza — ofertar-te-ia (com mais sinestesia que com arte) os beijos do final da tarde, quando o sol, sem alarde, vai-se pôr.
Se não tenho o sabor deste encantamento, acho que naquele mágico momento em que as asas da gaivota que sobrevoava o Tejo te comunicaram meu ser, pude conhecer-lhe o gosto. Minha poesia fez-se eterna na lembrança em que me fiz presente, na gaivota que te olhou o rosto e se fez permanente nas asas olentes destes versos, que misturaram para sempre os nossos (tão contíguos e descontínuos) universos.
Publicado no dia 30 de março de 2004 em
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