sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Danza de las espadas




E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra a hera,
E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia.
Fernando Pessoa - Eros e Psique






Cantam as espadas e a viola. Viola-se um corpo. Fadas dançam para um corvo. Augúrios e mistérios, espúrios perjúrios, etéreos doentes, todos se tocam. Atrás da pedra se pressente o ser. Evocam um deus longínquo em língua nunca falada. Dançam as espadas...

Vinte e cinco sabeus descem a montanha. Estranha a sensação do que se pode. Respira-se magia e elegia, poesia e agonia. O que erode além dos muros é o peito da donzela. Bruxos trajando os escuros cortam em dois o tronco virgem. Bela é a música que a tudo preside. O sangue elide das veias a vida venal.

Cheias de lidas, as mãos e o punhal se prendem ao rito. Um grito, ao longe, denuncia o Sabá. Correm de lá todos os bruxos, deixando arder ao fogo a carne branca da donzela. Meu sangue regela. Acordo exangue do pesadelo. Meu refestelo dura poucos segundos. Eu me inundo ouvindo o cutelo soar. Congelo ao lembrar que lâminas traspassarão a fauna lânguida de minha alma. Visto a mortalha assim: retalha-me a dança das espadas em mim.

Meu pânico é ser a donzela que vai arder no próximo conciliábulo das trevas. Acho que pressentia que eu mesmo era, inda tonto do que houvera, a donzela que ardia...


Publicado no dia 10 de janeiro de 2004 em http://www.icaroberanger.blogger.com.br/.

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